2 de abril de 2015

Sobre descobrir-se: identidades (des)construídas e a importância do reconhecimento

*Por Fernanda Kalianny A 19º Parada do Orgulho LGBT de São Paulo traz como tema esse ano “eu nasci assim, eu cresci assim, vou ser sempre assim: respeitem-me”. A princípio, poderíamos, estando longe da realidade LGBT, achar um tema interessante. Mas será mesmo que todas/os nascemos, crescemos e sempre seremos assim? Ao nos encontrarmos e […]



1 de abril de 2015

Policiais serão capacitados para atender à população LGBT

A partir do próximo mês, aulas serão incluídas nos cursos de formação de militares e civis, através de parceria entre a Secretaria de Segurança e o programa Rio Sem Homofobia

Policiais civis e militares serão capacitados para atender à população LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros). Realizada em parceria entre a Secretaria de Segurança e o programa estadual Rio Sem Homofobia, coordenado pela Superintendência de Direitos Individuais, Coletivos e Difusos da Secretaria de Assistência Social, a ação vai oferecer vídeo-aulas sobre atendimento, abordagem e atuação. Baseadas em casos reais, os vídeos serão seguidos de debates que incluirão temas relacionados a direitos humanos, democracia, cultura e cidadania.

A qualificação para atendimento ao público LGBT existe desde 2009, com palestras e cursos que já capacitaram 12 mil policiais. A partir de abril, as vídeo-aulas serão incorporadas ao curso de formação dos PMs. No segundo semestre será a vez dos policiais civis que ingressarem na corporação.

“Essa capacitação reforça a função dos policiais de proteção dos cidadãos, independente de opções pessoais. Somos servidores púbicos com uma série de atribuições, entre elas a garantia de direitos e o atendimento igualitário”, disse o subsecretário de Educação, Valorização e Prevenção da Secretaria de Segurança, Pehkx Jones da Silveira.

Responsável pela elaboração das vídeo-aulas, o coordenador do Rio Sem Homofobia, Cláudio Nascimento, explicou que os materiais produzidos para cada corporação serão diferentes, por causa da especificidade dos serviços prestados.

“Queremos qualificar o maior número possível de policiais para que possam atender cada vez melhor ao público LGBT. A redução dos casos de abuso de autoridade mostra que a formação tem contribuído para a ampliação do conceito de policial cidadão”, afirmou Nascimento. Em 2007, o Rio Sem Homofobia recebeu entre 100 e 150 denúncias sobre abuso de autoridade e preconceito contra LGBT. Em 2014, foram menos de dez casos.

Abuso sexual: maior parte dos agressores conhece vítima, diz estudo

Cerca de 70% dos criminosos têm total capacidade de entender a gravidade do ato

As imagens mais frequentes de um criminoso sexual são de um homem à espreita, um estranho que observa crianças no parquinho ou alguém que passa a maior parte do tempo recluso, obcecado com pornografia e sofrendo com algum transtorno psíquico. Embora registros policiais mostrem que alguns praticantes dessa forma de violência correspondam a essa representação, dados apontam que os estereótipos são mais exceção do que regra.

De acordo com um estudo produzido recentemente pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), os agressores, em grande parte das vezes, não são tão deslocados socialmente quanto se imagina, conhecem as vítimas e não têm diagnóstico de doença mental, sendo capazes de entender a gravidade de seus crimes

Na análise, uma equipe coordenada pelo psiquiatra Alexandre Martins Valença investigou as características sociodemográficas, as correlações clínicas, as características de comportamento criminoso e o nível de responsabilidade penal dos infratores sexuais encaminhados para avaliação psiquiátrica forense na capital fluminense. Ao todo, os pesquisadores revisaram 44 relatórios produzidos em 2008 por especialistas indicados por tribunais referentes aos crimes de estupro, tentativa de estupro, atentado violento ao pudor e exposição indecente.

O levantamento mostrou um perfil bem diferente do que ainda faz parte do imaginário de muitas pessoas. Além das características descritas anteriormente, a maior parte dos casos envolvia pessoas empregadas em tempo parcial. O único ponto que corresponde ao estereótipo é que, em todos os casos, os suspeitos eram homens. “De fato, muito eventualmente, aparece uma agressora do sexo feminino. E, às vezes, quando acontece, o crime é cometido em parceria com um homem”, atesta Hugo Ricardo Valim de Castro, perito médico-legista e chefe da Sessão de Sexologia Forense da Polícia Civil do Distrito Federal, que não participou do estudo.

Em casa

A pesquisa evidencia que a violência sexual costuma, portanto, ser um crime cometido por homens contra mulheres jovens – muitas crianças e adolescentes – que eles conhecem. Dos 44 documentos analisados, 13 diziam respeito a crimes contra uma integrante da família do agressor e 12 contra pessoas próximas. Em 31,8% das vezes, a violência tinha acontecido na casa dos suspeitos.

Quanto à saúde mental, 43,2% dos homens avaliados não receberam diagnóstico de qualquer transtorno psiquiátrico, mas nove infratores foram diagnosticados com retardo mental. Em 36,4% dos casos, alguma forma de transtorno mental ou neurológico foi identificada, mas não a ponto de tirar a responsabilidade pelo ato – 70,4% foram considerados completamente responsáveis por seus crimes; 18,2%, parcialmente responsáveis; e 11,4%, não responsáveis, por motivo de insanidade. Em 10 casos (22,7%), o agressor estava sob a influência de álcool. O levantamento mostrou ainda que os sujeitos com distúrbios mentais ou neurológicos eram mais propensos a estarem alcoolizados no momento do crime.

“Em alguns casos, há doentes mentais, psicopatas, mas nem sempre. Um traço que aproxima os agressores é o fato de terem sido vítimas de violência sexual ou doméstica na infância. Isso é um fator que, de certa forma, predispõe o indivíduo a ter comportamento violento no futuro”, analisa Hugo Castro. Segundo ele, apesar de terem consciência de seus crimes, na maioria das vezes, não há arrependimento. “Esse não é um comportamento comum. E, muitas vezes, o agressor tem dificuldade de reconhecer que fez algo de errado. No contexto contra crianças, ele se sente no direito de praticar a violência, por ser pai ou padrasto”, observa o perito.

Cultura

A observação de Castro aponta para aspectos culturais que podem favorecer a prática de crimes sexuais. Um estudo conduzido pela antropóloga Rita Laura Segato, na Universidade de Brasília (UnB), por exemplo, apontou que muitos homens presos por estupro adotam um discurso moralista, no qual defendem o ataque às mulheres como um ato “disciplinador”, pois várias delas mereceriam tal “punição” por não se comportarem de maneira adequada – o que pode significar, simplesmente, não usar roupas que os agressores consideram respeitáveis.

Apesar de outras pesquisas apontarem que crimes sexuais são cometidos mais por jovens entre 16 e 25 anos, no estudo da UFRJ, a idade média no momento da infração foi de 44 anos. Não se pode excluir, no entanto, a possibilidade de alguns dos acusados terem cometido outros atos antes de serem descobertos.

Quando a violência é contra crianças, diz Hugo Castro, o agressor costuma ser adulto e um pouco mais velho. E nesses casos é ainda mais comum que o criminoso mantenha uma relação afetiva com a vítima. “Não necessariamente há uma associação do uso de entorpecentes e álcool, embora o alcoolismo seja comum entre agressores do ambiente doméstico”, acrescenta o médico e policial. Segundo ele, esse perfil não possui um histórico violento, como costuma ser o do agressor fortuito, que pratica a agressão contra mulheres desconhecidas e geralmente na rua.

Segundo o perito, esses casos costumam ser praticados por indivíduos com passagem pela polícia, por roubo ou homicídio, por exemplo. Essas ocorrência são mais frequentes à noite, em locais ermos, e é comum que o agressor tenha consumido álcool ou outro tipo de entorpecentes.

56,8% Porcentagem dos casos em que a vítima era da família ou conhecia o agressor, segundo levantamento da UFRJ

Análise psiquiátrica

A avaliação da responsabilidade criminal, de acordo com o Código Penal Brasileiro, baseia-se em um conceito biopsicológico. Isso significa que a responsabilidade penal completa só pode ser excluída se o agressor estava, ao tempo da ação criminal, sofrendo de um distúrbio mental (de origem biológica) e, como consequência, era completamente incapaz de entender a ilegalidade de seus atos e evitá-los. Para tanto, a existência de um nexo de causalidade entre o transtorno mental e o delito deve ser estabelecida sem dúvida. A possibilidade de casos com responsabilidade limitada, resultante de uma deficiência parcial de funções cognitivas, também é contemplada pela lei brasileira.

No Brasil, a avaliação do estado mental no momento do delito é feita durante o processo judicial por um psiquiatra nomeado pelo tribunal. A avaliação é chamada de exame de imputabilidade penal. Aqueles isentos da culpa de seus atos ilícitos pagam a pena com tratamento involuntário em regime de internamento nos hospitais psiquiátricos forenses. No Distrito Federal , quando a Justiça conclui que o criminoso não tem capacidade de responder pelos atos, ele é condenado à medida de segurança. Isso é um tratamento que, em Brasília, é realizado na ala de tratamento psiquiátrico, uma área isolada dentro do presídio feminino.

Isabela de Oliveira


Workshop internacional sobre violência contra as mulheres reúne Sistema de Justiça e rede de atendimento

Dezenas de profissionais do Sistema de Justiça e da rede de atendimento se reuniram para debater caminhos na efetivação diária da Lei Maria da Penha 

Durante três dias, dezenas de profissionais do Sistema de Justiça e da rede de atendimento estiveram reunidos em São Paulo debatendo os desafios cotidianos para efetivação da Lei Maria da Penha (11.340/2006) e construindo caminhos para superá-los. O Workshop Internacional Violência contra a Mulher, Parceria Avon Foundation/Vital Voices pelo fim da violência doméstica, realizado de 25 a 27 de março, foi resultado de uma iniciativa inovadora internacional que foi cuidadosamente adaptada à realidade brasileira e aconteceu pela primeira vez no País.

O evento- fruto de uma parceria entre Instituto Avon, Instituto Patrícia Galvão e as organizações norte-americanas Vital Voices e AEquitas – reuniu 55 representantes do Poder Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, Segurança Pública e profissionais dos serviços públicos de saúde e assistência psicossocial e da sociedade civil que atuam diretamente no acolhimento, proteção, investigação e julgamento de casos de violência doméstica e familiar contra mulheres.

União de esforços para garantir acolhimento e proteção


Com foco em repensar práticas para estabelecer um trabalho conjunto e cooperativo, onde o centro é a segurança da mulher, o evento propôs que os integrantes dos diferentes setores dialogassem e refletissem sobre suas práticas para compartilhar experiências e construir conjuntamente novos caminhos para superar velhos problemas.

“Somente com a união de todos esses esforços vamos conseguir enfrentar a violência contra as mulheres. Por isso, é muito importante estarmos aqui. Avançamos muito nos âmbitos normativos e nas políticas públicas, mas o desafio do acesso à Justiça está colocado para nós”, pontuou a secretária-adjunta da Secretaria de Enfrentamento à Violência da Secretaria de Política para as Mulheres da Presidência da República (SPM-PR), Aline Yamamoto, na abertura do evento, ao lembrar dos avanços em tratados, legislações e normas nacionais e internacionais que contribuíram para evidenciar que a violência contra as mulheres é uma violação aos direitos humanos, um assunto de Estado e um obstáculo ao desenvolvimento de um país.

Jacira Melo, diretora-executiva do Instituto Patrícia Galvão e ativista há 35 anos pelos direitos das mulheres, comemorou a iniciativa, avaliando que o workshop irá reforçar ações de proteção, acolhimento, acesso à Justiça e compromisso com a responsabilização de agressores, contribuindo para mudar mentalidades em um País machista. “Convivemos com índices dramáticos de violência que impossibilitam o desenvolvimento social e econômico. Mas estamos também vivendo um processo que é lento, mas que de modo vigoroso e sustentável coloca em curso uma mudança das instituições no sentido do Compromisso e Atitude pela Lei Maria da Penha”, destacou.

Especialistas internacionais reconhecem força da Lei Maria da Penha


O workshop já foi adaptado e ministrado em outros países, como México, África do Sul, China, Camarões e Nepal em 2014. A metodologia foi originalmente desenvolvida pelas organizações norte-americanas Vital Voices e AEquitas – em um projeto mais amplo da Global Partnership to End Violence Against Women, composta pela Avon Foundation for Women, Vital Voices e o Departamento de Estado dos EUA.

De acordo com a especialista norte-americana que conduz a iniciativa em diferentes países, Cindy Dyer, vice-presidente de Direitos Humanos da Vital Voices, o Brasil conta com uma das melhores leis protetivas de violência doméstica no mundo. “Caso vocês não saibam, em todos os países quando se pensam em ações que estão fazendo um importante trabalho no sentido de proteger suas mulheres, o Brasil e a Lei Maria da Penha são citados “, frisou.

A especialista, que já foi promotora no Texas (EUA), destacou também a importância do empenho dos profissionais envolvidos em concretizar a lei no dia a dia. “Muitos países têm boas leis e sentam para admirá-la, mas o Brasil não está fazendo isso, vocês estão implementando iniciativas para fazer as vítimas terem não só a atenção que precisam, mas a Justiça que merecem”, destacou.

O cônsul geral dos EUA em São Paulo, Dennis Hankins, também reforçou o reconhecimento internacional à Lei Maria da Penha. Para o cônsul, os dois países enfrentam problemas culturais semelhantes em relação à violência de gênero e a reflexão é um passo importante para transformar estas realidades: “a violência contra as mulheres, com suas peculiaridades, é um problema global, e precisamos de formação para preveni-la”, reforçou.

Iniciativa privada na Campanha Compromisso e Atitude

O workshop integra as ações da Campanha Compromisso e Atitude pela Lei Maria da Penha, da qual o Instituto Avon é parte desde 2012. “A iniciativa privada tem muita responsabilidade, tem que combater esse mal. Muitas de nossas revendedoras são vítimas de violência e, por isso, temos o compromisso de divulgar a Lei Maria da Penha e o Ligue 180 não só para elas, mas para as 20 milhões de mulheres que nossos catálogos atingem”, frisou Alessandra Ginante, vice-presidente de Recursos Humanos da Avon e presidente do Conselho do Instituto Avon. A mensagem foi reiterada por Lírio Cipriani, diretor executivo do Instituto Avon, que apresentou a Linha 180, lançada recentemente pela empresa.

Para a secretária-adjunta da SPM-PR, Aline Yamamoto, as ações do Instituto Avon são um exemplo de medidas que as empresas podem implementar para fazer sua parte no enfrentamento à violência. “Esse workshop é um exemplo do impacto que esse engajamento tem”, indicou.

Promovida pelo Instituto Avon em parceria com o Instituto Patrícia Galvão, a primeira edição do workshop no Brasil contou com o apoio institucional da SPM-PR e da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Prefeitura de São Paulo, bem como com a colaboração das instituições parceiras da Campanha Compromisso e Atitude pela Lei Maria da Penha nos níveis nacional, estadual e municipal.

Débora Prado
Publicado originalmente no Portal Compromisso e Atitude no dia 25 de março de 2015.