8 de abril de 2014

PESQUISA IPEA - FOI UM ERRO????

Diante do erro crasso de divulgação de resultados do IPEA sobre a percepção a respeito da violência contra mulher, mas antes mesmo de alguém dizer qualquer coisa que se assemelhe a um “está tudo bem” e que isso tudo é “mero alarde das mulheres” ou qualquer tentativa de amenizar o problema, cabe lembrar ou esclarecer a atual realidade da mulher no Brasil: o problema é sim, muito maior do que parece. O Brasil é o 7º colocado entre os países com os maiores índices de feminicídio. Resultado da tolerância social quanto a violência contra a mulher, proveniente de uma forte tendência em aceitar a culpabilização da vítima como forma de justificar a violência ocorrida. A própria existência da lei nº 11.340, batizada de Maria da Penha, é um sinal da nossa intolerância, já que mesmo leis e políticas afirmativas como esta são insuficientes para brecar a escalada do que não deveria nem existir. Em 2011, foram atendidas 70.285 mulheres vítimas das mais diversas formas de violência, com a predominância da violência doméstica ou sexual. Isso significa 192 atendimentos diários ou oito mulheres a cada hora. A vergonha nacional é endêmica. A violência é íntima: em metade dos casos o agressor é o parceiro ou ex-parceiro da mulher. O homicídio vem aumentando drasticamente . Somos duas vezes mais violentos com a mulher do que 40 anos atrás. Houve apenas um momento de decréscimo: o primeiro ano de vigência da lei Maria da Penha. De lá pra cá tudo voltou ao “normal”.

Educação perpetua visão machista

Matamos 4.465 mulheres em 2010. A comprovação de que hoje se mata muito mais do que antes é a taxa de homicídio, em que o número absoluto é comparado pelo tamanho da população feminina: saltou de 2,3 (em 1980) para 4,6 (por mil mulheres). O índice dobrou. O peso da passionalidade no crime contra a mulher pode ser notado pela forma com que as mortes ocorrem. Homens são assassinados, em sua grande maioria, com armas de fogo, enquanto mais da metade das mulheres morrem estranguladas, atingidas por objetos cortantes ou demais meios que a só a crueldade pode criar. Elas são vítimas de um jogo social que não só as oprime, como as condena. A violência sexual é mais preponderante entre 1 e 14 anos. A violência física adquire destaque a partir dos 15 anos de idade. A realidade deste dado está não só intimamente ligada à forma na qual nos estruturamos socialmente, mas também ao modelo cognitivo em que estamos inseridos e perpetuamos. Violência sexual: é toda ação na qual a pessoa, em situação de poder, obriga outra à realização de práticas sexuais contra vontade, por meio de força física, influência psicológica, uso de armas ou drogas. Jogos sexuais, práticas eróticas impostas, estupro e atentado violento ao pudor são alguns exemplos. Em 2011, 13 mil mulheres sofreram violência sexual. O Ministério da Saúde pressupõe que apenas 10% casos de violência sexual são efetivamente registrados. O número acima é, portanto, apenas a ponta de um imenso problema. A maioria dos casos ainda continua somente sob as vistas do agressor. Os motivos alegados para que os registros sejam tão inferiores à realidade, vergonha e medo de novas agressões, refletem apenas o descrédito da mulher quanto a segurança pública (que não a protege) e o sistema jurídico (que não condena ou o faz morosamente). Além, é claro, da incoerente vitimização do culpado e culpabilização da vítima. Leis e políticas afirmativas não dão, por si só, resultados. Há uma grave falha na nossa educação, repleta de preconceitos que teimam em perpetuar uma visão ainda machista que serve como base à violência contra a mulher. É preciso tornar o tema parte importante de uma agenda pública. E tomar consciência de onde vive. (Alexandre Marini é licenciando em Sociologia) (Observatório da Imprensa, 08/04/2014)

SOBRE A VERGONHA DE SER HOMEM

Nos últimos dias, uma pesquisa realizada pelo IPEA tornou-se tema das conversas (e dos jornais, novelas, etc.) em todos os lugares. Segundo a pesquisa, 26% dos entrevistados concordam que “mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas”. O resultado chocou. Mas era previsível. Nosso Estado é machista, assim como nossas instituições e mesmo nossas práticas cotidianas. Na verdade, creio que o espanto maior foi deparar-se com esse fato assim, de uma forma tão crua e escancarada.

Talvez, contudo, o pior tenham sido as reações que se seguiram. Várias pessoas,especialmente homens, postando fotos e vídeos sobre como, sim, mulheres mereciam ser estupradas se não se “respeitassem” (entre aspas, entre muitas aspas). Foi ainda mais chocante. Aqui, porém, quero falar sobre aqueles que não concordam com a tal frase, especialmente com os homens que não concordam, pois, concordando ou não, ser homem tem certos sentidos e significados que, considerando como as coisas são hoje, não podem ser ignorados.
Eu escolhi me tornar um homem. Ainda que essa escolha seja contingenciada por uma série de fatores que, de alguma forma, fizeram com que tal escolha não fosse assim tão livre, passar por um processo físico e social de “transição” foi, em última instância, uma decisão minha, tomada de forma deliberada e consciente. Tornei-me um homem, mas não quero ser confundido com esse modelo de macho, símbolo de violência, que é prescrito pela nossa sociedade patriarcal.
Não posso negar que o almejado reconhecimento social da minha masculinidade traz consigo os desconfortos de ser lido por muitas mulheres como uma ameaça. É uma equação simples: homens são um vetor de violência; eu sou um homem; logo, eu sou um vetor dessa violência. É uma leitura simplista e automática, por certo, mas é a que é possível em diversas situações - no meio da rua, ás 2h da manhã, as mulheres já se acostumaram a fugir dos homens, sempre potenciais estupradores.
Eu não sou um estuprador. Mas o gênero que hoje performo é a representação da ameaça desse ato de violência. Muitos homens se sentiram ofendidos por serem tomados como violentos, assim, a priori mesmo. A esses homens, eu queria dizer que ficar reclamando com as mulheres não vai ajudar em nada, não vai mudar nada. Não são elas que estão erradas; somos nós!
De novo, eu não sou um estuprador, mas o meu gênero é, e isso eu não posso negar. O que posso fazer é colaborar para construir uma nova cultura da masculinidade. Uma masculinidade sensível, não-violenta, capaz de dialogar, em vez de ameaçar. Vamos ressignificar o que é ser homem, em vez de ficar proclamando quão injusta é essa generalização. Sentir-se pessoalmente ofendido pela maneira com que as mulheres reagem, e atacá-las, ofendê-las por isso é justamente continuar reproduzindo o problema, uma vez após a outra.
A minha masculinidade, uma série de vezes, entrou em contradição. Tenho muitas experiências similares às relatadas pelas mulheres, afinal eu fui mesmo uma adolescente. Como tal, sofri assédio no ônibus, tive que correr pra não sofrer nenhum ataque em uma rua escura. Naquele momento, eu era o objeto dessa violência. Mas, sendo esta tão generificada, passei de objeto a potencial autor da violência. E só ficar repetindo que eu, individualmente, nunca pratiquei esse tipo de violência não causa nenhum impacto.
Essa defesa cega dos atos individuais parece, na verdade, uma forma ingênua (?) de demonstrar o quanto não somos capazes de chegar à raiz do problema. Debater a masculinidade e procurar formas de ressignificá-la chega quase a soar como a própria ausência de masculinidade. Como se negar o modelo violento e opressor de macho fosse o mesmo que negar-se homem.
A culpa nunca é da vítima, é sempre do agressor e, quase sempre, a vítima é uma mulher e o agressor é um homem. É preciso que os homens assumam, sim, a responsabilidade pela violência que é perpretada pelos seus pares. Ainda que eu (ou você!), especificamente, não seja um agressor, a responsabilidade também é minha, uma vez que reivindico-me como homem.
Eu escolhi me tornar um homem. Mas, hoje, tudo que consigo sentir é vergonha por ser um deles.

7 de abril de 2014

BENTO TERÁ PATRULHA MARIA DA PENHA NO SEGUNDO SEMESTRE




A rede de enfrentamento à violência contra a mulher em Bento Gonçalves contará com um importante incremento. O trabalho que já vem sendo desenvolvido pela Coordenadoria da Mulher, em conjunto com a Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM), será ampliado no segundo semestre com a Patrulha Maria da Penha. De acordo com o prefeito Guilherme Pasin, é preciso que os diversos poderes constituídos se unam para acabar com esta chaga. "Precisamos nos unir para encaminhar soluções práticas para Bento Gonçalves, excluindo-a do rol dos municípios com casos de violência familiar e doméstica", salienta. Paralelo à isso, a Coordenadoria da Mulher também trabalha para a implantação de uma Sala Lilás no município, espaço para acolhimento de mulheres vítimas de violência sexual ou de violência doméstica e familiar. "Estamos lutando para que Bento Gonçalves possa contar com este espaço que é muito importante para dar um atendimento digno às mulheres que passaram por algum tipo de violência, proporcionando um acolhimento humanizado, que evita constrangimentos", comenta a coordenadora Regina Zanetti.
A aquisição dos equipamentos e a viatura que serão utilizados na Patrulha Maria da Penha já estão em fase de licitação por parte do Governo do Estado. A informação foi dada pela assessora da Secretaria de Segurança Pública do Rio Grande do Sul, Anita Kieling, na manhã desta sexta-feira, dia 4 de abril, durante reunião de trabalho realizada no Salão Nobre da Prefeitura. "Bento Gonçalves já conta om um trabalho e uma rede de enfrentamento da violência contra a mulher bem desenvolvido.
Sem esta rede de autonomia, não teríamos como diminuir os casos de violência contra a mulher", destaca.Uma Patrulha Maria da Penha é formada por quatro policiais militares, sendo dois homens e duas mulheres, que contam com uma viatura diferenciada, já que a ideia é que ela seja identificada nas visitas realizadas às residências das vítimas, mostrando para a sociedade, principalmente para vizinhos e agressores, o engajamento do Estado na proteção daquela mulher. 
Os profissionais que atuam na Patrulha passam por capacitação de uma semana com aulas sobre temas relacionados à violência doméstica, como a Lei Maria da Penha, psicologia forense, andamento de processos, depoimento sem dano, entre outros. Além da especialização, o diferencial da Patrulha é que ela não atende a ocorrência, mas sim trabalha após o delito, fiscalizando o cumprimento da medida protetiva e acompanhando mulheres que foram vítimas de agressão.

Rede de enfrentamento à violência

Durante a reunião de trabalho, os principais mecanismos que compõem a Rede de Atendimento da Segurança Pública para o Enfrentamento à Violência Doméstica e Familiar foram apresentados à comunidade. O objetivo do encontro foi aprimorar a compreensão da sociedade sobre o papel de cada organismo de governo dentro do fluxo de atendimento às mulheres vítimas de violência. O conceito de rede de enfrentamento à violência contra as mulheres diz respeito à atuação articulada entre as instituições/serviços governamentais, não governamentais e a comunidade, visando ao desenvolvimento de estratégias efetivas de prevenção e de políticas que garantam o empoderamento e construção da autonomia das mulheres, os seus direitos humanos, a responsabilização dos agressores e a assistência qualificada às mulheres em situação de violência.
O chefe da divisão de estatística e Coordenador do Observatório da Violência contra a Mulher da Secretaria de Segurança Pública, Major Luis Fernando de Oliveira Linch, apresentou os dados estatísticos da violência contra a mulher e a Patrulha Maria da Penha. "Este é um trabalho inovador que estamos realizando no Rio Grande do Sul e que já está sendo procurado por outros estados", explicou. O observatório reúne dados estatísticos e fomenta o debate para que os casos de violência não caiam no esquecimento. "O monitoramento mostra que entre 2012 e 2013 houve queda de 12,7% nos casos de estupro e de 9,8% dos femicídios. São dados para comemorar, mas não descansar", complementa.
A delegada de polícia titular da DEAM de Bento Gonçalves Isabel Pires Trevisan, detalhou os projetos que são desenvolvidos no município. "A delegacia é a porta de entrada da maioria dos casos. Precisamos da ajuda dos demais órgãos para dar o suporte necessário para a mulher agredida", observa. A delegada destacou ainda a parceria com a Prefeitura para a implantação e manutenção de um núcleo da Polícia Civil dentro do Policiamento Comunitário. Bento Gonçalves foi o primeiro município no país a contar com este núcleo, onde os policiais em horários fora do expediente trabalham nas comunidades em ações como a prevenção da reincidência das agressões.
O funcionamento da Sala Lilás foi explicado pela corregedora do Instituto Geral de Perícias e Coordenadora da Sala Lilás, Andréia Brochier Machado. Trata-se de um ambiente diferenciado, privativo e acolhedor, enquanto a vítima aguarda pelo atendimento de peritos, psicólogos e assistentes sociais, entre outros profissionais. Há também kits padronizados de coleta para as vítimas de agressão sexual.
Ao final do encontro foi lida uma moção de apoio às DEAMs. O documento foi elaborado no último dia 20 de março, durante o XII Fórum Regional de Políticas para as Mulheres das Regiões da Serra, Campos de Cima da Serra e Hortênsias do Rio Grande do Sul, realizado em Bento Gonçalves.

Assessoria de Comunicação Social Prefeitura
Foto: Gustavo Bottega