17 de dezembro de 2014

Mulher no Parlamento: Brasil ocupa 123º lugar

Da diretora da escola à presidente da nação, é comum ver mulheres desempenhando papel de liderança no dia a dia. A impressão que se tem é de que as mulheres “chegaram lá”, mas, quando se avalia os dados numéricos de mulheres exercendo as funções mais elevadas na vida pública, vê-se que, na verdade, as mulheres, em sua maioria, ainda estão fora do poder. O mesmo acontece no Judiciário e no ambiente corporativo. De acordo com o ranking da representação feminina no Parlamento de 189países – feito pela União Inter-Parlamentar (IPU) conforme o porcentual de mulheres nos Parlamentos nacionais –, o Brasil está na 123ª posição. Países da América Latina como Bolívia (2º), Cuba (4º), Nicarágua (9º) e Equador (10º) estão bem à frente do País, segundo dados de novembro de 2014.

Nas eleições mais recentes, de 2014 e 2012, Suely Campos (PP-RR) foi a única governadora eleita no Brasil. Será a primeira vez que Roraima, o menor colégio eleitoral do Brasil, será comandado por uma mulher. Esse resultado faz parte de um universo de 22.168 candidaturas para as eleições ocorridas em outubro deste ano. No cômputo geral, os porcentuais ficaram próximos ao exigido pela legislação, que é de pelo menos 30% para um dos gêneros. Ocorre que o gênero feminino é o que sempre fica com a minoria das vagas. Neste ano, a divisão foi de 28,71% para mulheres e 71,29% para os homens. Em 2010, Roseana Sarney (PMDB-MA) e Rosalba Ciarlini (DEM-RN) saíram vencedoras.

Quando é feita a divisão por cargos, tanto entre candidaturas quanto entre os eleitos, é possível ver a discrepância entre a participação da mulher em termos populacionais e eleitorais e a sua representação no Executivo e no Legislativo. Na disputa pela Presidência da República, oito homens (72,73%) e três mulheres (27,27%) se dispuseram a participar. A diferença, nesse caso, foi que duas mulheres, Dilma Rousseff (PT) e Marina Silva (PSB), estiveram durante quase todo o tempo entre os três com mais intenções de voto. Ao final, a presidente Dilma Rousseff foi reeleita. Ela entrou para a história como a primeira mulher eleita presidente do Brasil e a primeira a ser reeleita.

Dos 163 candidatos a governador em todo o Brasil, 19 (11,66%) eram mulheres e 144 (88,34%), homens. Apenas uma conseguiu se eleger. O que representa 5,26% das candidatas do sexo feminino. O total de candidaturas para senador foi quase o mesmo: 165, sendo 131 homens (79,39%) e 34 mulheres (20,61%). Como só havia uma vaga por Estado, 27 senadores foram eleitos: cinco mulheres (18,52%) e 22 homens (81,48%). A partir de 2015, o Senado passará a contar com um total de 11 mulheres. A porcentagem de candidaturas femininas ao Senado e aos governos estaduais se manteve estável nas duas últimas eleições.

A ex-deputada federal e ex-candidata ao Senado pelo Partido dos Trabalhadores (PT) Marina Sant’Anna chama a atenção para o tempo reduzido de participação dos trabalhadores e das mulheres na história republicana do Brasil. Embora a eleição da primeira prefeita do Brasil e da América Latina, Luíza Alziro Soriano Teixeira, tenha ocorrido em 1928, e a posse, em 1929, as mulheres brasileiras só conquistaram o direito ao voto em 1932. Luíza Soriano ficou no cargo, em Lajes, no Rio Grande do Norte, durante sete meses. Foi destituída por não concordar com o governo Getulio Vargas.

“O Brasil está em posição de atraso em relação ao resto do mundo, mas está em condições de busca crescente para que o número de mulheres seja ampliado no contexto não só do Legislativo e do Executivo, mas também nas organizações da sociedade civil”, acredita Marina. Ela conta ter o costume de observar a composição das mesas em solenidades e eventos importantes. “Dificilmente é possível ver pelo menos um terço de mulheres nessas mesas”, diz.

Espaço da mulher aumenta devagar

O Brasil tem avançado, ainda que lentamente. Nas eleições de 2010, 45 deputadas federais foram eleitas. Neste ano, o número passou para 51 (9,95%) entre 513 escolhidos pelo eleitorado. A corrida já começou desigual no número de candidaturas. Das 5.940, 4.204 (70,77%) eram de homens e 1.736 (29,23%), de mulheres. Em Goiás, o índice é parecido. Dos 17 escolhidos para a Câmara federal, 15 são homens e duas (11,76%), mulheres.

Flávia Morais (PDT) obteve a terceira melhor votação geral, com 159.122 votos. Atrás do fenômeno de votação delegado Valdir Soares, do PSDB (274.625 votos), e de Daniel Vilela, promessa de renovação do PMDB (179.214). Magda Mofatto (PR-GO) ficou com a quinta posição, com 118.458 votos. O mesmo número de eleitas em 2010, quando Iris Araújo (PMDB) foi a mais votada (185.934). Flávia Morais conseguiu 152.553 votos. Magda Mofatto não foi eleita, mas acabou assumindo uma cadeira na Câmara, como suplente, em 2011. O mesmo aconteceu com Marina Sant’Anna (PT), que ficou como deputada entre 2011 e 2013.

Assim como acontece na Câmara, as mulheres (115) são 11% das deputadas estaduais eleitas em todo o País. O porcentual de candidaturas ficou dividido entre 10.250 homens e 4.177 mulheres (28,95%). Este ano, em Goiás, quatro mulheres (9,76%) foram escolhidas pelos eleitores, de um total de 41 parlamentares. A petista Adriana Accorsi participou de uma eleição pela primeira vez e foi a terceira melhor votada, com 43.424 votos.

Partidos têm condições de eleger governadora ou prefeita, diz petista

Na avaliação de Marina Sant’Anna, todos os partidos goianos têm condições de ter mulheres como prefeita de Goiânia ou governadora do Estado de Goiás. Algumas foram queimadas dentro dos próprios partidos. “Mas é preciso haver um pouco de mudança cultural para que isso ocorra e a redução de dependência de um líder patriarcal”, afirma.

Ela cita Adriana Accorsi (PT) como um dos exemplos no próprio partido, que obteve uma votação expressiva como deputada estadual, já na sua primeira eleição, tornando-se a primeira deputada estadual do PT.

Marina Sant’Anna comenta que, pela história e amizade das duas, nunca irão competir pelo mesma candidatura. Ela diz também que há outras mulheres capacitadas na sigla, sem citar nomes. “Ainda não começamos a tratar disso no partido, mas o nome da Adriana me agrada muito e eu estou sempre disponível para o partido”.

Estudo

Há mais de 30 anos na vida pública, Marina tem dedicado bastante tempo em observações e estudos sobre mulheres e poder. Ela listou alguns dos possíveis motivos para o distanciamento da mulher da vida pública. Um deles é a formação da maioria das mulheres, que a coloca em situação de sensibilidade diante de alguns aspectos da política como a agressividade do discurso e, principalmente, a má conduta de alguns políticos, independentemente do partido que representam.

Sem contar que, embora haja mulheres nas bases, elas não são vistas como representantes viáveis e o partido não dá oportunidade a elas. “O mesmo acontece com os jovens, à exceção de filhos de personalidades políticas, e de negros e negras. O que existe e se perpetua no poder são homens brancos, com determinado patrimônio e determinada conduta”, avalia.

Compromissos familiares ainda pesam nas decisões

O fato de a mulher continuar sendo responsável no núcleo familiar, pelos que dependem de adultos, como crianças, idosos e doentes, é outro impeditivo para a mulher aderir à vida pública, já que o seu tempo fica ainda mais reduzido. Marina Sant’Anna destaca que mesmo nos casos, cada vez menores, de mulheres que têm empregada doméstica, a situação se repete e de certa forma fica ainda pior, já que se torna cíclica. “Aquele trabalho continuará sendo realizado por uma mulher, que também tem família e também precisará de alguém em casa”, explica.

Marina acredita que, além do trabalho de atração e formação de novas lideranças nas bases dos partidos, a reforma política é fundamental no sentido de contribuir para a mulher conquistar mais espaço. Para ela, o financiamento público de campanha ou, pelo menos, a retirada das empresas do financiamento de campanha, já ajudariam, pois o poder econômico de algumas candidaturas deixaria de ter tanta relevância.

“Para as mulheres, jovens, negros, homossexuais que queiram também ser representantes públicos é importante demais ter algum tipo de lista partidária, que possibilitaria que o financiamento de campanha seja colocado a serviço de todos”, defende a ex-deputada.

A paridade de gêneros é outro ponto que ela acredita ser importante. “Nós somos 52% da população e do eleitorado. Significa que deve ter em uma lista uma mulher, um homem, e assim por diante. Tenho certeza de que não haverá dificuldade em encontrar uma mulher preparada, pois elas existem em todos os lugares, embora muitas não queiram fazer parte desse jogo do sistema eleitoral existente”, diz.

Menos de 5% dos cargos em empresas

Assim como acontece no Legislativo, o número de mulheres a ocupar os cargos principais em empresas é reduzido no Brasil. Inferior a 5%, segundo a presidente da Associação Comercial e Industrial do Estado de Goiás (Acieg), Helenir Queiroz. Mas ela vê o cenário com otimismo. “Cerca de 15 anos atrás era traço (quase inexistente)”, afirma. A empresária se tornou a primeira mulher a presidir a Acieg em 78 anos de existência da entidade classista. Ela também é a primeira a presidir o Fórum Empresarial de Goiás.

“Tenho 62 anos. A minha geração foi educada para ficar em casa”, diz a empresária, para quem esses avanços tendem a ser cada vez mais rápidos. Para Helenir, quanto mais a sociedade amadurece e evolui, maior e mais relevante é a participação da mulher.

A líder classista alerta, no entanto, para um problema comum a muitas mulheres: a culpa que sentem por se ausentar do lar para trabalhar. “Essa é uma questão cultural, uma espécie de freio psicológico. A mulher não precisa escolher entre o crescimento profissional e a maternidade. Há tempo para tudo e dá tempo de fazer tudo”, conclui.

Versanna Carvalho

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